FOLCLORE ACREANO - A balsa para Manacapuru/AM, a terra onde se dança ciranda ao som do choro do surubim.
Quem nunca foi passageiro da nossa folclórica balsa, após a divulgação do resultado das eleições?
Eu já ... e desta vez com minha candidata ao Senado (Perpétua Almeida) e meu candidato a Deputado Estadual (Marcelo Siqueira). E sem stresss ...
Faz parte da Democracia respeitar o veredicto das urnas, minha genteeeeeeeeeeeeee!
É da autoria de Gilberto Braga, da Companhia de Selva, o primoroso texto sobre essa contribuição genuinamente acreana ao Folclore nacional. Leia e se divirta.
"Esta é genuinamente acreana: pegar balsa significa perder uma eleição. É um misto de brincadeira, chacota e vingança do povo acreano contra os seus políticos. Quando um candidato perde uma eleição, diz-se que ele “pegou balsa”, ou “embarcou na balsa de Manacapuru”.
Isso pode ser dito de forma branda, com tom de brincadeira, mas pode ser dito ou entendido como uma ofensa terrível, uma humilhação a mais para quem já saiu humilhado das urnas. Segundo o folclore político local, depois de cada pleito eleitoral a balsa pra Manacapuru parte do Porto da Gameleira.
Os candidatos derrotados embarcam acompanhados dos assessores e cabos eleitorais mais importantes. O momento mais dramático da viagem dá-se lá longe, já depois da Boca do Acre, quando a balsa cruza a curva que descortina o Estado do Amazonas e aí se aproxima um cardume de surubins para chorar em torno dos perdedores, que surubim é peixe que chora e chora alto. É uma tristeza, um desconsolo sem tamanho. Pegar a balsa e ouvir o choro do surubim é o pior instante da carreira de qualquer político acreano.
Essa história da balsa é tão divertida quanto cruel, pois quem vence e é festejado numa eleição, pode muito bem comandar a balsa do pleito seguinte. Estando na política, é difícil evitar essa viagem. O sujeito perde a eleição e no outro dia não pode sair nas ruas, as pessoas, os amigos, as crianças lhe abordam:
- Pegasse balsa, heim? Depois me conta como é o choro do surubim.
E o pior vem nos jornais, com charges de páginas inteiras, mostrando a balsa repleta de candidatos vencidos, a maioria de passageiro, alguns ainda pior, ralando como tripulante, outros resistindo ao embarque.
Única, original e absolutamente integrada à cena política do Acre, descrita e comentada por toda população, a balsa é uma manifestação cultural impressionante, a mais genuína contribuição acreana ao folclore político nacional. Consta que a história da balsa vem de tempos priscos.
Li que o professor Marcos Fernandes, da Universidade Federal do Acre, descobriu que essa história começou ainda no começo do século. Em 1920 o Governo Federal teria destituído o prefeito do Departamento do Alto Acre, como se fosse pouco, mandou também deportar o alcaide em desgraça. A ordem foi cruel: embarcar o homem numa balsa de propriedade do Governo, largando-o abandonado na primeira curva após o Rio Acre entrar no Estado do Amazonas.
Documentos constantes do acervo do saudoso senador Guiomard Santos, ex-governador do território e patrono da elevação do Acre à condição de Estado, confirmam a longevidade da balsa, da qual, aliás, nem o próprio Guiomard escapou. Os alfarrábios de Santos registram a existência da balsa na década de 50, com jornais locais da época anunciando com entusiasmo o embarque do delegado Aluizio Queiroz, que teria levado uma sova nas urnas em respostas a sua suposta truculência.
Queiroz, no entretanto, resistia, declarando: “não subo na balsa para não viajar em companhia de alguns desafetos políticos”. Mas foi, o que já é um registro inconteste da condição de instituição democrática e popular da balsa.
Mas o folclore político nacional deve creditar o mérito da afirmação dessa fantástica contribuição acreana, ao cronista Aluizio Maia. A partir do fim dos anos 60, ela firmou-se com seus artigos bem humorados, anunciando a preparação da balsa durante as campanhas eleitorais e, depois das eleições, fechando sua ilustre lista de passageiros.
Aluizio também teve o mérito de definir os pontos atuais de partida e de chegada da balsa. Se no primeiro registro dos anos 20 ela largou um solitário passageiro após a primeira curva do Rio Acre no Estado do Amazonas, modernamente parte lotada do Porto da Gameleira, na margem direita do rio, no 2º Distrito da capital Rio Branco, com destino a bucólica cidade de Manacapuru, Amazonas.
Mas agora a balsa se materializa muito além dos artigos de Aluizio. As charges dos jornais são esperadas, repercutidas na televisão e multiplicadas em cópias xerox ou reproduzidas nas gráficas de Rio Branco, para alegria do povo e desespero dos ilustres passageiros, que, por vez, reproduzem o choro triste do surubim".